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Risco de alta da Selic segue no radar

Valor econômico |12.08.2024

A cobrança de parte do mercado por um tom mais duro e preocupado do Banco Central (BC) em relação às pressões inflacionárias foi atendida na semana passada, com menções explícitas da autoridade monetária a uma retomada, se necessário, de um processo de elevação da taxa básica de juros. A maior parte do mercado continua esperando pela manutenção da Selic em 10,5% por um longo tempo, mas há um viés de alta nas projeções para o juro básico no fim do próximo ano, ao mesmo tempo em que o debate sobre a necessidade de um novo ciclo de aperto monetário tem se fortificado.

Na pesquisa conduzida pelo Valor entre 7 e 9 de agosto com 109 instituições financeiras e consultorias, o ponto-médio das projeções ainda aponta para uma Selic de 10,5% no fim deste ano. No entanto, a mediana das estimativas para a taxa de juros no fim de 2025 ficou em 9,75% – um aumento de 0,25 ponto percentual em relação ao levantamento divulgado no fim de julho.

Se no fim de julho apenas três casas projetavam elevações na Selic até o fim deste ano – Novus Capital, Reag Investimentos e XP Asset Management -, outras instituições passaram a adotar essa visão em seus cenários, embora ela ainda seja minoritária. São os casos de Itaú Asset Management, JGP e Panamby Capital, entre outras instituições.

O mercado de juros, que já precificava elevações na Selic até o fim deste ano, consolidou as apostas em altas na taxa de juros nos próximos meses, mesmo com o alívio observado no câmbio. O tom duro adotado pelo Banco Central – em especial a preocupação com a inflação destacada pelo diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, em discurso na semana passada – ajudou a cristalizar as apostas em torno de uma Selic mais apertada à frente.

“Com o discurso de Galípolo, que reforçou a mensagem dura da ata, a chance de frustração e de não haver aumento dos juros em setembro é pequena, na nossa visão”, diz a economista-chefe da Tenax Capital, Débora Nogueira. “E se o câmbio se valorizar?
Bem, se a Selic não subir, parece mais provável que o câmbio volte a depreciar”, defende a economista, que passou a esperar um aperto das condições monetárias ainda este ano, que leve a Selic a 11,25% em dezembro.

“Concordamos com o BC de que o risco para a inflação é altista. Afinal, estamos lidando com uma economia que cresce mais do que imaginávamos, com um mercado de trabalho aquecido e um crescimento significativo dos salários, e a inflação já está em 4,5% em 12 meses, ainda com risco de alta dos preços industriais devido ao câmbio mais desvalorizado”, afirma a economista. Para a Tenax, a Selic deve chegar a 11,5% no começo do próximo ano, mas a convicção em relação ao ajuste total “não é grande”.

“Enquanto o modelo sugere um ajuste pequeno (até menor que 1 ponto), o balanço de riscos coloca o viés totalmente para cima.”

No caso da Kinea Investimentos, a expectativa é de uma elevação da taxa de juros, mas que deve ocorrer somente no próximo ano, já no primeiro semestre, e que deve totalizar 1 ponto percentual, ainda que o momento da retomada do aperto monetário dependa da trajetória do real, de acordo com a economista Daniela Lima.

Ela, inclusive, nota que a comunicação do BC tem ficado gradualmente mais conservadora desde a decisão do Copom. “Parecia que o BC tinha escrito no comunicado que o balanço de riscos estava assimétrico. Na ata, aumentou o tom, dizendo que não hesitaria em voltar a subir os juros. E, depois, o Galípolo foi mais duro do que na ata, classificando o balanço de riscos como assimétrico e dizendo que, na sua avaliação, uma inflação de 3,2% está acima da meta”, nota.

“Isso é importante, porque sempre existe dúvida do que seria uma inflação ‘em torno da meta’. Para o Galípolo, 3,2% é acima da meta e ele se mostrou bastante desconfortável com o cenário de inflação”, afirma Lima, cujo cenário base aponta para um IPCA de 4,2% neste ano e de 4,5% em 2025 em meio à piora nas estimativas de preços de bens industrializados e da pressão sobre a inflação de serviços.
“O qualitativo da inflação vai piorando ao longo do tempo. O BC está numa estratégia de comprar tempo. Se nós tivermos um rali de curto prazo no real, o Copom consegue comprar esse tempo e subir a Selic só em 2025. Mas temos uma inflação rodando perto do teto da meta neste ano e no teto da meta no ano que vem. Tem uma margem de quanto o BC, de fato, consegue segurar essa alta de juros”, avalia.

O economista-chefe do Banco Daycoval, Rafael Cardoso, mantém como cenário base uma Selic de 10,5% no fim deste ano, ao apontar que essa “ainda parece ser a vontade do BC, que mantém esse plano de voo como cenário de referência”, afirma. Para ele, no entanto, há uma série de dificuldades para que a estratégia do Copom seja bem-sucedida. “A estratégia do 10,5% está condicionada a que coisas benignas aconteçam do lado da inflação”, aponta.

Entre elas, de acordo com o economista, está uma apreciação cambial, que dê folga para a inflação de curto prazo; uma desaceleração da atividade econômica, que leve a uma abertura do hiato do produto; e uma melhora nas expectativas de inflação. Para evitar um aumento nos juros, os três eventos deveriam acontecer, mesmo que parcialmente, na visão de Cardoso.

“Achamos que ainda há uma apreciação do câmbio para acontecer e que, assim, os efeitos nos ‘tradables’ vão ser mais suaves. Temos alguma preocupação com as expectativas, já que o BC pode soar duro, mas, sem ajuda do fiscal, é difícil vencer essa batalha na totalidade. O mais provável é que voltemos ao equilíbrio anterior, onde, passada a maior tensão do ponto de vista fiscal, as expectativas parem de piorar”, afirma.

A maior preocupação, no entanto, está relacionada à atividade econômica. “Não acreditamos que ela vai permitir que o BC leve a Selic abaixo da taxa neutra. Ainda assim, vemos que a estratégia de uma Selic parada em 10,5% até meados do ano que vem é vencedora”, afirma Cardoso, ao projetar o juro básico em 9,5% em 2025.


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