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MídiaFim do ciclo de alta da Selic divide mercado; juro pode alcançar 14%
Maioria dos agentes espera alta de 0,5 ponto na taxa de juros nesta semana
Por Gabriel Roca e Victor Rezende — De São Paulo
O atual ciclo de aperto monetário, que entra agora em seu 18º mês, pode estar próximo do fim. Diante de um aumento de 11,25 pontos percentuais na taxa básica de juros e de sinais emitidos pelo Banco Central de que a magnitude do aperto implementado é relevante, a maioria dos participantes do mercado acredita que o Comitê de Política Monetária (Copom) deve entregar nesta semana uma última alta de 0,5 ponto na Selic, que, então, ficaria em 13,75%. Essa visão, contudo, está longe de ser consensual, e, com a forte deterioração nas expectativas de inflação de médio prazo, uma parcela relevante dos agentes espera que a taxa suba a pelo menos 14% neste ano.
Levantamento feito pelo valor entre os dias 27 e 29 de julho aponta que as expectativas de inflação de médio prazo continuaram a escalar. O ponto médio das 110 estimativas coletadas para o IPCA de 2023 ficou em 5,4%, nível bem superior ao teto da meta de inflação do próximo ano (4,75%). Além disso, outro movimento que já tem preocupado os agentes é a desancoragem das expectativas em horizontes ainda mais longos. A mediana de 86 projeções coletadas aponta para um IPCA de 3,5% no fim de 2024, nível superior ao centro da meta (3%).
E é nesse ambiente que inclui um estágio de ciclo de ajuste de juros já avançado, mas que também abarca condições ainda bem negativas em relação à inflação corrente e prospectiva, que há uma clara divisão entre os participantes do mercado quanto aos próximos passos na condução da política monetária. Cabe apontar que, na decisão desta semana, o horizonte relevante para a atuação do Copom deve incluir o ano-calendário de 2023 e, em menor grau, 2024.
Assim, ainda que a expectativa de um aumento de 0,5 ponto no juro básico nesta semana seja praticamente consensual, a perspectiva para a Selic no fim do ano ainda provoca divisão expressiva entre os economistas de mercado. A pesquisa do Valor aponta que 65 casas esperam que a taxa básica chegue a 13,75% nesta semana e fique parada nesse nível; 32 veem a Selic em 14% em dezembro; e 17 projetam uma taxa de 14,25% no fim do ano.
“Embora haja, de fato, alguma possibilidade de o Copom optar por interromper seu ciclo de aperto monetário, especialmente dada a significativa extensão e intensidade [do aperto], não acreditamos que isso ocorrerá em agosto”, afirma o economista-chefe da BB Asset, José Maurício Pimentel. Para ele, o quadro inflacionário prospectivo e os riscos em torno das expectativas ainda não são “suficientemente seguros” para que o BC encerre ou mesmo pause o ciclo.
“O patamar da inflação corrente e de seus núcleos e índices de difusão ainda não exibiram descompressão importante. A recente queda nos preços de commodities no mercado internacional pode ajudar, mas há risco importante de retomada da alta deles tendo em vista potenciais novos problemas de oferta”, diz Pimentel. A BB Asset espera que o ciclo termine só em setembro, com a Selic em 14,25%.
Ao simular os modelos de inflação do BC, a economista-chefe e sócia da Gap Asset, Anna Reis, estima que a nova projeção da autoridade monetária para a inflação no fim de 2023 deve subir de 4% na decisão de junho para algo em torno de 4,3%, em um movimento de alta ocasionado, em especial, pela recomposição de alguns tributos prevista para 2023. Com isso, a estimativa de inflação do BC se afastaria ainda mais do “redor da meta” – estratégia que o Copom revelou, na última decisão, que tem perseguido. Esse movimento, na visão de Reis, justificaria um novo ajuste nos juros em setembro.
“Reproduzindo a mecânica que ele tem utilizado, nós ainda achamos que a conclusão será de que algum aperto adicional será necessário. Dado o patamar já muito elevado de Selic, ele pode sinalizar uma nova alta de menor magnitude ou até mesmo deixar a porta completamente aberta, no sentido de não dar novas altas”, afirma. Além da alta de 0,50 ponto no juro nesta semana, a economista da Gap Asset trabalha com um aumento final de 0,25 ponto em setembro, quando o Copom deve encerrar o ciclo.
Embora espere um ajuste residual em setembro, Reis acredita que o nível dos juros na economia brasileira já é bastante restritivo, com uma taxa real ex-ante em torno de 8,3%, nível semelhante ao do ciclo de aperto monetário de 2015.
Além disso, a economista acredita que as projeções de inflação de 2023 estão contaminadas pelos choques que afetam a inflação corrente. “São três anos consecutivos de choques expressivos, que levaram a inflação brasileira e global para patamares altos e existe uma tendência dos economistas de extrapolar o cenário para frente. Acreditamos que o risco da inflação de 2023 é maior de ser para baixo do que para cima”, diz. A Gap projeta o IPCA em 5% em 2023 e em 3% em 2024.
O chefe de pesquisa para América Latina do BNP Paribas, Gustavo Arruda, avalia que o papel do BC, neste momento, é o de conter o problema. “A desancoragem das expectativas aconteceu e estamos vendo números mais altos, rodando acima de 5%. O desvio das expectativas está aumentando, não diminuindo. Se eu não sei o que vai acontecer com o cenário inflacionário, é preciso trabalhar com o balanço de riscos. E, dentro desse ambiente, eu preferiria ter o risco de fazer mais do que menos, embora seja mais custoso em termos de atividade”, defende Arruda.
O BNP Paribas foi uma das primeiras casas a apontar para um cenário de Selic na casa de 14% – uma estimativa que continua no cenário básico do banco. “Não consigo ver o BC parando neste momento. Nós sabemos que a inflação, no curto prazo, vai cair por motivos não relacionados à política monetária, mas as expectativas do ano que vem estão subindo, assim como as de 2024”, diz.
“E, de notícias, sabemos que vai ter mais gasto público, que deve gerar um ‘boost’ [impulso] de demanda na margem. O BC esperava que a política monetária começaria a desacelerar o crescimento a partir do terceiro trimestre, mas uma parte considerável vai ser contrabalançada pela política fiscal”, nota Arruda. Para ele, o risco é o BC encerrar o ciclo neste momento e poder colher expectativas ainda mais altas à frente.
A ansiedade em torno da comunicação do Copom em relação aos próximos passos da política monetária tem aumentado, já que o colegiado costuma sempre indicar o que antevê para a decisão seguinte. Com o ciclo próximo do fim, o mercado deve se manter bastante atento aos sinais do colegiado para calibrar suas apostas.
Os economistas do Itaú Unibanco esperam que o Copom sinalize que o cenário mais provável é o de encerramento do ciclo, mas que deixe a porta aberta para uma eventual alta final do juro básico em setembro caso ocorra nova deterioração do cenário inflacionário. “Adicionalmente, acreditamos que a autoridade monetária deve qualificar que um eventual ajuste adicional seria implementado em menor ritmo (0,25 ponto)”, dizem os economista do Itaú, que projetam a Selic em 13,75% no fim do ciclo.
A economista-chefe para Brasil do HSBC, Ana Madeira, acredita que o Copom deve tentar dar “o mínimo de informação possível” e apresentar poucas alterações em relação ao comunicado da decisão de junho, ao manter um tom mais dependente da evolução dos indicadores. “Também espero que o BC se dê alguma abertura para reduzir o ritmo na próxima reunião”, diz.
De acordo com a economista, a recente deterioração nas expectativas de inflação deve obrigar o Copom a entregar mais uma alta residual de 0,25 ponto em setembro. Ela avalia que, somente no próximo mês, a desaceleração da atividade econômica deve começar a dar sinais mais claros e abrir espaço para a autoridade monetária colocar fim ao ciclo de aperto.
Madeira estima ainda que a contínua normalização dos choques de oferta no ano que vem e uma desaceleração sincronizada da economia global devem provocar uma desinflação mais rápida na economia – o HSBC tem uma projeção de 4% para o IPCA em 2023. “Em abril do ano que vem, o IPCA já deve estar rodando na casa dos 6%. Vai ser um sinal de que vamos começar a entrar em um cenário de queda da inflação e isso vai dar espaço para o BC iniciar o ciclo de corte de juros”, projeta a economista, que estima a Selic em 9,75% em 2023.
Na sexta-feira, a curva de juros precificava uma Selic em torno de 14% no fim do ano e entre 12,25% e 12,50% em 2023. Já o mercado de opções de Copom, na B3, apontava 88% de probabilidade de um aumento de 0,5 ponto na taxa Selic nesta semana, contra 11% de chance de alta de 0,25 ponto. Em relação à reunião de setembro do Copom, o mercado apontava 35% de chance de estabilidade, 40% de possibilidade de uma alta de 0,25 ponto e 21% de probabilidade de um aumento de 0,5 ponto.
O cenário-base da Garde Asset contempla altas de 0,5 ponto no juro em agosto e em setembro, o que levaria a Selic para 14,25%. “Acreditamos que o BC deve levar em conta a desancoragem adicional das expectativas. Essa é a preocupação dele e ele terá de reagir a isso”, diz o economista-chefe da gestora, Daniel Weeks.
“O foco total da decisão vai estar na sinalização do Copom sobre os próximos passos. E, dada a deterioração do cenário prospectivo de inflação entre as reuniões e a deterioração fiscal, tanto pelo risco maior quanto pelo aumento da renda disponível, fica muito difícil para o Copom fechar a porta e dizer que vai parar de elevar os juros”, diz. Na visão de Weeks, o BC deve manter a porta aberta para elevar a Selic na mesma magnitude – 0,5 ponto – ou em ritmo menor em setembro.
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