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Após melhora no 2º tri, PIB vive incerteza

|29.08.2022

Projeções apontam que o desempenho da economia no 1º semestre deve carregar resultado do ano tri, PIB vive incerteza

Por Marcelo Osakabe e Marta Watanabe — De São Paulo

O bom desempenho da economia brasileira na primeira metade do ano deve carregar, praticamente sozinho, o resultado do PIB para o ano de 2022. Puxado especialmente pelo setor de serviços, esse dinamismo, no entanto, não deve se repetir na segunda metade do ano, momento em que os efeitos defasados do aperto monetário devem começar a aparecer de forma mais firme, ao passo que a incerteza cresce por causa da eleição e fatores como o impulso da reabertura também perdem efeito.

A mediana de 75 estimativas colhidas pelo Valor aponta para expansão do PIB de 0,9% no segundo trimestre contra o trimestre anterior. Com isso, o ponto médio para o resultado fechado do ano, com base em 80 coletas, chegou a 2,1%, ante 1,4% no fim de maio. Destas, apenas 16 ficam abaixo de 2%.

O trimestre passado mostrou crescimento generalizado, com destaque para serviços, indústria e agropecuária, diz Lucas Maynard, economista do Santander. Nos serviços, ele aponta o impulso dado pela reabertura da economia, o aumento da renda disponível com melhora do mercado de trabalho e os efeitos dos estímulos fiscais, como antecipação de pagamento do 13º e a liberação do FGTS.

O quadro de maior renda também favorece o consumo de bens industriais, setor beneficiado pela melhora dos gargalos logísticos globais causados pelo descompasso entre oferta e demanda. Dados de estoques, diz Maynard, sugerem gradual normalização das cadeias produtivas. A indústria, particularmente, teve desempenho melhor no primeiro semestre deste ano, ao contrário do observado na segunda metade de 2021, quando foi afetada por renda menor e pela preferência por serviços no mix de consumo.

O Santander projeta crescimento de 1,1% para o segundo trimestre de 2022, na margem, e espera alta de 1,9% no PIB do ano, com viés de alta. O carregamento estatístico para o segundo semestre é de 2,3%. Ou seja, com crescimento zero no segundo semestre, seria esse o crescimento do PIB do país.

Para o economista-chefe do Bradesco, Fernando Honorato Barbosa, além da questão conjuntural, dada pela bateria de medidas do governo, houve componente estrutural: o surpreendente dinamismo recente do mercado de trabalho. “Vejo dois motivos para o bom momento do emprego. De um lado, a reforma trabalhista, que trouxe maior flexibilidade em contratar e demitir, reduziu o custo para o empresário. De outro, o preço relativo dos salários em relação aos investimentos mostra que hoje é mais vantajoso contratar.”

“Se pegarmos, por exemplo, o indicador de capacidade utilizada da indústria [Nuci] da FGV, vemos que está rodando acima de 80%, o que deveria dar impulso a investimentos. Só que os empresários estão preferindo contratar, e isso não tem só a ver com a reforma. Os salários estão perto dos níveis vistos em 2012”, diz. Em julho, o Nuci da indústria bateu 82,3%, maior patamar desde março de 2014.

Se o primeiro e o segundo trimestre foram pródigos em surpresas positivas, o período seguinte é rodeado de incertezas. Isto porque é esperado, de um lado, que os efeitos do aperto monetário do Banco Central tornem-se mais intensos, ao passo que o impulso dado pela reabertura pós-covid acabe e as incertezas em relação às eleições freiem investimentos. Não por acaso, a mediana das 67 projeções colhidas apontam alta de 0,2% para o PIB do terceiro trimestre.

O que complica a leitura é que, na contramão desses fatores, surgem questões como o Auxílio Brasil de R$ 600 a partir de agosto, as desonerações tributárias e a desaceleração da inflação, que prometem dar impulso adicional à atividade. No cenário externo, o aperto das condições monetárias globais que se desenhava no fim do primeiro semestre também acabou atenuado – ao menos por hora – por postura ligeiramente mais “dovish” [menos intransigente com a inflação] por parte do Federal Reserve, o banco central americano. Diante disso, alguns economistas acreditam em um viés altista para os números do período.

Na 4Intelligence, a estimativa atual é de contração de 1% do PIB no terceiro trimestre, mas o número não contabiliza possíveis efeitos cruzados do Auxílio Brasil, diz o analista Wellington Nobrega. “Com a inflação em queda, o mercado de trabalho aquecido e as políticas anticíclicas do governo, o consumo das famílias pode se sair melhor do que se projeta hoje.”

Fernando Rocha, economista-chefe da JGP, também discorda da tese de “apagão repentino” na passagem para a segunda metade do ano. Em seus cálculos, o PIB cresceu 0,6% no segundo trimestre, na margem, feito o ajuste sazonal. Considerando o resultado do primeiro trimestre, isso gera um carregamento estatístico de 1,9% para o segundo semestre, diz.

Para ele, a desaceleração será mais gradativa do que se imagina. A geração de emprego tem sido forte, surpreendendo mês após mês e isso, diz, aumenta a massa salarial e sustenta demanda por serviços. Para os próximos trimestres, Rocha espera avanço de PIB de 0,4% em cada um, na margem. Assim, diz, ainda que a projeção oficial da JGP para 2022 seja de 2,2%, é possível que a taxa alcance 2,5%.

Outro fator que pode dar sustentação à atividade no terceiro e no quarto trimestres é o investimento de governos locais, que viu um “boom” no início do ano, diz Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset. “Os gastos dos municípios foram muito fortes, podem gerar carrego para o segundo semestre e fazer a Formação Bruta de Capital Fixo surpreender um pouco no ano.” Dito isso, a expectativa na gestora é que esse conjunto de fatores não baste para compensar fatores baixistas. De olho em dados e relatos negativos que já despontam no varejo e na construção civil, a casa projeta expansão de 0,1% no terceiro trimestre.

Olhando para 2023, as estimativas também têm se deteriorado. A mediana das 78 projeções colhidas foi de expansão 0,4%, contra 0,7% na pesquisa anterior.

Pesam nesse sentido, além do efeito contracionista da política monetária, que atingirá seu efeito máximo no início de 2023, a incerteza sobre a política econômica do próximo governo, diz Honorato, do Bradesco. Em sua opinião, as dúvidas sobre o que vem pela frente não serão sanadas apenas com o resultado das eleições.

“Ainda não temos detalhes sobre esse novo arranjo, e acredito que a incerteza permanece até o primeiro semestre de 2023. Pode ser que o novo governo construa enorme confiança do mercado, de forma que o câmbio se valorize, a inflação caia mais rápido e a Selic também. Pode ser que não”, diz Honorato, que vê crescimento zero em 2023. “A questão é que, com juro pré rodando em 7,5% e a taxa longa a 6%, é inegável que a incerteza está aí e afetará a economia.”

No Santander, a estimativa é de recuo de 0,6%, mas com viés de alta. Entre os fatores que Maynard cita jogando contra o PIB no ano que vem, estão o esgotamento dos efeitos da abertura e o cenário externo ainda desfavorável.

A EQI se coloca em campo mais otimista, com previsão de alta de 0,9%. “ Acreditamos que o setor agrícola terá novamente um bom ano em 2023, crescendo perto de 3,5%. Os juros altos são menos relevantes para o segmento, que tem crédito direcionado. Além disso, a desaceleração mundial afeta mais as commodities metálicas, as agrícolas são melhor isoladas”, diz. “O agro tem participação relativa menor na economia, mas gera efeitos indiretos positivos também.”

Acesse a matéria original aqui.


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