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MídiaFundos de crédito driblam taxa apertada
Descompasso entre emissões e fluxo neste ano fez prêmio de dívida diminuir
Desafiados pelo baixo retorno das debêntures que estão sendo emitidas, gestores de fundos de crédito têm colocado na mesa a decisão de ampliar o caixa dos produtos ou fechar para captação, à medida que as opções de títulos no mercado estão mais escassas e o fluxo de capital para a renda fixa continua alto.
Na JGP, por exemplo, estão fechados para captação 95% dos produtos de crédito, afirma o sócio da gestora e responsável pelos fundos de crédito, Alexandre Muller. “Temos que atuar com controle da capacidade”, diz.
O gestor diz que outro ponto que precisa ser levado em conta é que há muitos papéis no mercado com chance de recompra. Ou seja, as companhias emissoras têm a opção de recomprar as debêntures que estão em circulação.
Essa combinação de uma grande demanda pelos papéis não suportados pela oferta, levando à compressão das taxas, não era vista desde 2019, segundo Muller. Naquele momento, os fundos de renda fixa também receberam grande fluxo de dinheiro. A diferença é que a indústria era mais restrita do que hoje.
As emissões de debêntures neste ano até julho somam R$ 256,8 bilhões, um recorde. Apesar disso, são insuficientes para absorver a demanda, já que nem tudo vai para fundos. Segundo a Anbima, associação das instituições que atuam nos mercados de capitais, os fundos de renda fixa captaram R$ 256,3 bilhões no mesmo período. Com a forte procura, o spread (diferença entre as taxas pagas pelos papéis e o CDI) saiu de 2,3% há um ano para 1,7%, conforme a JGP e desconsiderando títulos de Americanas e Light, que enfrentaram dificuldades e distorcem o retrato.
O interesse em crédito é influenciado pela perspectiva de alta da Selic, mas também por mudanças regulatórias que restringiram as emissões de papéis incentivados, como os certificados de recebíveis imobiliários e do agronegócio (CRI e CRA) e reduziram o prazo de alguns títulos bancários. A taxação de fundos fechados exclusivos é outro fator que estimulou a migração para fundos de crédito.
Segundo o sócio da JGP, fechar os fundos é uma forma de não diluir os cotistas com mais caixa. “Restrinjo minha capacidade e tento manter o retorno”, diz. Se a taxa Selic voltar a subir, acrescenta, a situação pode se tornar mais complexa.
Já a Porto Asset decidiu fechar os fundos em uma das plataformas com maior fluxo de entrada de recursos, na tentativa de restringir a captação. “As gestoras têm algumas opções e fechar para captação é uma delas”, afirma Ricardo Espindola, gestor de crédito da casa. “Achamos melhor seguir dessa forma para não compensar o menor spread com mais risco na carteira.”
O fundo da Porto já está com o nível máximo de caixa, em cerca de 40%. “Existe uma perspectiva de pouca emissão e a captação deve continuar forte. O cenário de Selic não reverte essa perspectiva e tudo aponta para uma redução adicional desses spreads, mas deveria haver um limite”, afirma.
Apesar das condições mais difíceis, ainda dá pra navegar no mercado de crédito, diz Daniel Celano, diretor-presidente da Schroders no Brasil. Alguns caminhos para as gestoras neste momento, diz, incluem alocar os recursos em papéis com menor qualidade de crédito, mas com spreads melhores, ou aumentar a “duration” [prazo médio] do portfólio para tentar capturar resultados com a marcação a mercado dos títulos.
“É importante ter cautela para não captar e aumentar o risco de crédito sem o cliente perceber” – Daniel Celano
“Mas é importante ter cautela para não captar e acabar aumentando o risco de crédito sem o cliente perceber, ou alongar o passivo em um momento de juros mais altos por mais tempo.”
Segundo Celano, a estratégia também tem sido evitar empresas com necessidade de financiamento no curto prazo. “Nossa visão tem sido mais conservadora, buscando ter mais caixa que nosso ‘target’ [alvo]. Olhamos para as companhias que são menos alavancadas e para as que são menos dependentes do ciclo econômico.”
A falta de opções no mercado primário é preocupante, segundo Celano, mas também reflete o fato de que as companhias “olham para frente e não veem o PIB crescendo nem os juros caindo”.
Na ARX, a situação tem sido administrável, segundo Pierre Jadoul, gestor de crédito privado. A captação média dos últimos dois meses foi na casa dos R$ 500 milhões, afirma, mas o volume foi dividido em uma gama de produtos grande. “Não estamos com uma velocidade de crescimento tão grande e com dificuldade de alocar. Não está no radar no curto prazo fechar fundos”, diz.
Mesmo com a desaceleração de emissões no mercado primário, Jadoul diz que ainda é possível encontrar boas opções. “Quando olhamos o universo ‘high grade’ [empresas com as maiores notas de crédito] não dá para falar que está tudo amassado. Há uma compressão maior em ativos triplo A, em setores defensivos, mas fora deles há setores cujos spreads estão próximos do ‘high yield’ [empresas com maior risco]”, afirma.
Outra estratégia, diz Jadoul, tem sido buscar produtos de crédito estruturado, com retorno maior, mas com o mesmo risco de debêntures de grandes emissoras. “Você perde em liquidez, mas consegue garantir taxa.”
Na Capitânia, as soluções encontradas foram investir na troca de portfólio, disse Flávia Krauspenhar, sócia-fundadora da gestora, durante a Expert XP, no fim de agosto. “Fizemos muito caixa após o evento Americanas e aproveitamos para colocar em ativos de altíssima qualidade. Chegando neste ano, passamos a trocar por ativos com rating um pouco abaixo, onde você ainda encontra gordura”, afirma. A gestora também passou a olhar mais a originação de títulos ou participar dos chamados “club deals”, grupos de poucas casas que combinam o investimento em companhias que, no geral, estão fora do radar dos bancos.